O mais recente especial de Natal da Globo - Gilda, Lúcia e o Bode- trouxe uma temática antiga, mas infelizmente atual e bastante comum, que é o endividamento de pessoas com mais de 60 anos.
No programa vemos a Dona Gilda, com seus mais de 90 anos, pegando um empréstimo para pagar outro e colocando a casa como garantia. Quando assisti o especial lembrei automaticamente da minha avó. Quando cheguei na adolescência fiquei sabendo que ela pegava dinheiro emprestado com agiota. Na época não tinha dimensão do impacto de se ter uma dívida, muito menos nestes moldes.
Admito que inicialmente eu questionava, na verdade já estava julgando, aquele comportamento. Não entendia, não via motivos para ela, e até mesmo para outras pessoas, pegarem dinheiro emprestado. Era só se organizar, controlar os gastos, cortar os supérfluos que depois de um tempo de vacas magras as coisas melhorariam e as dívidas seriam quitadas.
Sabia de nada, inocente. Além da minha compreensão, naquele momento inicial da vida, existem as razões mais simples e mais arraigadas à condição humana. O orgulho, o sentimento de dever prover, a vontade irrefreável de querer ajudar o outro quase se fosse uma compulsão e a necessidade em si são alguns dos motivos que levam ao empréstimo.
O orgulho em poder prover a própria casa, ser capaz de comprar suas coisas, não querer pedir ajuda - principalmente aos filhos- pôde ser visto na Dona Gilda e na vida da minha avó também. Em adição a esse sentimento no caso da minha avó ainda existia a vontade de ajudar a todos que batiam à sua porta. Familiar ou não, quem chegasse pedindo qualquer tipo de auxílio ela fazia o máximo para contribuir.
Os adultos maiores de 60 anos, são mais de 31,5 milhões de pessoas no Brasil, e são as pessoas de referência ou arrimo de família de 19,3% das famílias brasileiras. Ou seja, para estes idosos apesar de uma vida de trabalho em sua velhice ainda existem familiares dependentes de sua aposentadoria ou pensão. Se juntarmos esta dependência aos altos valores de plano de saúde e remédios, por exemplo, fica fácil entender porque o idoso contrata um empréstimo.
Depois dessa rápida análise fica mais fácil perceber o que leva as pessoas mais velhas a se endividarem. O quanto um, aparente descontrole financeiro, na verdade pode ser o sentimento de independência, de querer manter a sua dignidade humana.
REFERÊNCIAS:
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) anual, de 2018, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), veja http://www.jornal3idade.com.br/?p=24722 .
DOLL, Johannes; SCHMITZ, Natália V. de Souza; SCHMITZ, Eduardo D. Envelhecimento e Finanças: um estudo sobre o endividamento de Idosos no Rio Grande do Sul, in XVIII International Finance Conference, 2018, 12.09 a 15.09, Brasil. Anais, p. 15 do original online
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