Empréstimo consignado é uma modalidade de concessão de crédito oferecido àqueles que tem uma fonte de renda garantida pelo governo. Servidores civis/militares, aposentados e pensionistas do INSS são os beneficiários a esse tipo de financiamento.
A principal característica desse empréstimo é o que conhecemos como margem consignável. Excetuando os militares - que devido à legislação própria podem dispor de até 70%-, todos os outros podem dispor de até 30% do valor líquido recebido. Exemplo: O servidor recebe R$ 1.500,00 de salário, mas com os descontos obrigatórios- imposto de renda e previdência,por exemplo- resta ao final, o valor de R$ 1.000,00. Esse é o salário líquido. É desse valor que o servidor pode ter até 30%, ou R$ 300,00, comprometido para o pagamento de parcelas do consignado.
Segundo o Banco Central, em 2018, foram realizados mais de 30 milhões de contratos consignados (1).Em 2019, esses números ultrapassaram em 14,8% o número total de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). No mês de junho, o número de contratos ativos atingiu o número de 32.559.758, enquanto que o total de beneficiários era de 28.352.256(2). Ou seja, existem pessoas com mais de 1 contrato ativo de consignados.
A facilidade na contratação e com juros bem mais baixos, em comparação aos que são cobrados em outras operações bancárias, são fatores propiciam o aumento do número de pessoas que solicitam esse tipo de empréstimo. Uma outra explicação para esse aumento significativo foi a alteração,feita em 2017, regulamentada pela Instrução Normativa (IN) nº 89 do Conselho Nacional de Previdência, que ampliou a possibilidade de seis para nove a quantidade máxima de contratos ativos para empréstimo pessoal com desconto direto no contracheque (3).
Apesar da possibilidade de aumento na quantidade de contratos a serem acordados, a margem consignável continua a mesma. O limite financeiro não foi ampliado.
Entretanto, um ano e meio depois desta publicação, em março de 2019, o INSS publicou outra IN com o propósito de mudar as regras de concessão do empréstimo consignado. A instrução objetiva evitar o assédio de instituições financeiras. A norma proíbe que elas efetuem qualquer atividade de marketing ativo, oferta comercial e proposta que tente convencer o beneficiário do INSS a firmar novos contratos de empréstimo pessoal e cartão de crédito, com pagamento mediante desconto direto no benefício, pelo prazo de 180 dias após a concessão do benefício. Ou seja, com a medida, bancos e financeiras não poderão oferecer novo empréstimo consignado em um período menor que seis meses (4).
Medidas como essa objetivam tanto evitar casos de fraudadores e assédio dos bancos, como evitar o fenômeno do superendividamento. Segundo pesquisas de 2018 da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas e do SPC- Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito), cerca de 60 milhões de brasileiros estão endividados. E 30 milhões desses estão superendividados.
Os superendividados podem ser classificados em duas categorias: o ativo e o passivo. O primeiro é aquele que consome além das possibilidades de seu orçamento. Já o segundo, a causa do seu endividamento excessivo são imprevistos da vida, como desemprego, redução de salários, separação, doenças, nascimento de filhos etc (5). De acordo com o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), o número de brasileiros nessa situação é de aproximadamente 30 milhões. Isso quer dizer que quase 15% da população (6).
Culpabilizar apenas o descontrole financeiro dos que estão nesta situação seria, no mínimo, precipitado. Mais do que um desequilíbrio nas contas, o superendividamento tem um pézinho de responsabilidade no sistema bancário e de crédito. O que hoje existe é uma estrutura que une oferta de crédito com juros altos, publicidade abusiva, ausência de educação financeira e de políticas públicas efetivas.
Sob a bandeira da autorregulação do mercado e a consequente diminuição do controle estatal, os bancos tem acordado, quase que, livremente suas taxas de juros e condições de pagamentos e sem prestar as devidas informações ao consumidor na hora de realizar o contrato. O Código de Defesa do Consumidor deixa clara a obrigação dos fornecedores de produto/serviço de prestar todas as informações necessárias a fim de deixar ciente o consumidor de todos os aspectos relativos ao negócio jurídico.
O descumprimento da obrigação de prestar informação eficiente na fase pré-contratual e no ato da celebração, influenciando decisivamente na opção consciente do consumidor, implica em vício de consentimento, tornando anulável a declaração de vontade (contrato firmado).
Faz-se então imperativa a necessidade de mudar o entendimento sobre a forma de conceder crédito no Brasil, de modo que se possa compreender que o problema do superendividamento não é apenas um problema do consumidor, mas também das instituições financeiras, que oferece um produto/serviço que não atende aos padrões legais de qualidade e transparência (8).
Bibliografia
https://guiadosbancosresponsaveis.org.br/superendividamento/
https://veja.abril.com.br/economia/superendividados-30-milhoes-ja-nao-podem-mais-pagar-suas-dividas/
BRASIL. Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm
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